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Espaço de reflexão Hermógenes de Castro e Mello

Você já foi a Caymmi?

Por Ildásio Tavares, de Salvador

Laços de afeto, afinidade e admiração, sempre me ataram a Dorival Caymmi, indiscutivelmente, um gênio da Música Popular Brasileira, um letrista excepcional, senão o que melhor soube explorar as sonoridades de uma língua portuguesa nagôtizada, com sua incrível sensibilidade para captar as contigüidades entre as línguas africanas e o português que a douta Yeda Pessoa de Castro descreve tão bem em seu clássico livro Falares Africanos da Bahia. Pai e mãe da letra de música, Caymmi chega ao requinte de criar sonoridades miméticas, praticamente onomatopéias que se erigem como imagens sonoras de nossa terra; das nossas coisas mais preciosas.

É magistral a seqüência de sons em que traça o figurino da baiana, no antológico O que é Que a Baiana Tem em que cada frase se arremata com o verbo tem, num verdadeiro repique de sino que sugere aos ouvidos a presença de uma igreja até que aparece a igreja do Bonfim. É uma verdadeira seqüência de fonogramas anunciadores, até a presentificação da igreja. Um prodígio. Aliás, Caymmi trabalhou como ninguém as nasais tão marcantes no português da Bahia.

E sobre ser um grande maestro de uma orquestra de sons verbais, Caymmi foi um dos mais autênticos reveladores da cultura mestiça da Bahia. Ele, Jorge Amado e Carybé, cada um no seu galho, fizeram a grande árvore genealógica da cultura de base de nossa terra que se completa com o olhar de Pierre Verger e tem seguimento numa plêiade de intelectuais que descobriram e divulgaram uma das fisionomias culturais mais características deste planeta. Caymmi estava aqui.

Andava para as bandas de Itapuã num tempo em que isso era um safári.

E de lá extraiu algumas das jóias mais preciosas da música brasileira.

Logo após o passamento deste gênio, ocorreu-me escrever um show em que eu fizesse uma antologia de suas canções mais significativas; mais emblemáticas de seu imenso talento e da Bahia que retratou tão bem. Comecei a pesquisar, a ouvir e reouvir canções, algumas das quais tinham eco no fundo da minha infância, Você já Foi à Bahia?, p.ex, na voz de Aurora Miranda, que escutei embevecido enquanto via o filme de outro gênio, Walt Disney, ainda menino. Esta canção é o mais sedutor comercial da Bahia que já ouvi, com sua gama de sons, cores, cheiros, gostos e a definição em preito de amor, tudo, tudo/ na Bahia faz a gente querer bem/ a Bahia tem um jeito/ que nenhuma terra tem – não há melhor definição de nossa marcante personalidade cultural que ameaça sucumbir com suas barracas cobertas de palha.

O título do show é o desta crônica, comecei a agrupar os blocos, os sambas populares, as canções praieiras, os sambas urbanos, as celebrações, e assim fui costurando o roteiro numa amostragem da obra gigantesca, aquele bordão vigoroso, inovador, marcando as cadências inimitáveis.

Hoje à noite, 20 h temos este show pela mão de outro bardo, abrindo a Casa da Música no Abaeté, Amadeu Alves. O elenco, a cara de Caymmi. Vocal, Márcia Short, Direção Musical, arranjos, violão, Edu Nascimento. Percussão, Mônica Millet, baixo Ângelo Santiago. Direção de Produção, Fabiana Marques.

Eu dirijo. Hoje à noite, às 20hs.

Você já foi a Caymmi?

O grande Dorival, imbatível.

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- 27/08/2010 (11:08)

No próximo dia 27, às 21hs na Casa da Música, Abaeté o gênio Dorival Caymmi será homenageado com um show intitulado “Você Já Foi A Caymmi?”.Com roteiro e direção de Ildásio Tavares, contando no elenco com a experiente cantora Márcia Short, que acaba de chegar de uma turné na Europa, Edu Nascimento, que responde pela direção musical, arranjos e violão, a percussonista internacional Mônica Millet, e no baixo acústico o talentoso Ângelo Santiago.

Este espetáculo faz uma varredura na obra de Caymmi, mostrando seus vários aspectos, desde as canções praieiras, músicas de base afro e os samba urbanos, revivendo no palco a grandeza deste gênio da música popular.

Projeto antigo do poeta Ildásio Tavares, foi idealizado para homenagear Dorival Caymmi, este que o poeta considera o melhor letrista da Música Popular Brasileira, e com quem mantinha uma relação de afeto e de grande admiração.Espaço da Fundação Cultural do Estado da Bahia, a Casa da Música vem-se notabilizando pela autenticidade de seus espetáculos que têm, inclusive, uma intenção didática, além do entretenimento com alto nível.