Conversa de pescador
Por Pedro Cardoso, de Brasília
Escrever é como comer peixe: você vai tateando, tirando a pele, separando os espinhos até que se sinta absolutamente confortável para saborear cada fatia do pescado como se fosse uma hóstia ou uma sílaba tônica.
Na minha cabeça não há nada que eu escreva que não mereça uma fisgada. Cada um de nós tem a sua maneira de ser e ponderar. Só que às vezes penso demais, sonho demais, escrevo demais e me esqueço das vírgulas, dos parágrafos, dos verbos e até das reticências. Sempre que escrevo espero que corrijam, que critiquem, que comentem para que eu possa crescer a cada ponto final. Para mim essas correções ou ajustes são como os alimentos que necessito para sobreviver como escritor, como poeta, como gente ou como um peixe fora d’água.
Um dia desses ouvi de uma amiga: “estou com saudade de mim”. Veja o quanto isto é simbólico, o quanto nos leva a pensar em nós mesmos como se fôssemos uma piaba em alto mar. Ah, não poderia deixar de registar este fato e muito menos esquecer de compartilhar com os que se divertem com a minha escrita! Desabafos como esse são como capturar um exemplar de vinte quilos em um pesque-pague de beira de estrada.
Conheço grandes “escritores” que guardam tudo na cabeça, que não pulicam nada. O que me entristece é o fato de que um dia eles vão morrer e com eles os seus registros. Na lápide desses meus amigos nem sei o que devo escrever, se é que devo!!!...
Se devo, vou escrever: ele era um peixe que só sabia nadar.
Sobre homens e peixes, ou pescadores e escritores, vejam também o interessante texto-réplica do formidável Humberto Werneck (ex-Folha, ex-Playboy) em "Caro Hermógenes..."