Trabalhar, eu?
Com o intuito de entender e melhorar as relações de trabalho, o proprietário da empresa onde trabalho (repito, raro alguém ganhar seu dinheiro com a escrita, por isso trabalho em outro ramo para pagar as contas), algum tempo atrás contratou um colega e consultor de relacionamentos em empresas, para averiguar o que ocorria; e estimular melhoras.
Houve durante algum tempo certo incremento no nível de, talvez, alegria. Mas não permaneceu, consultores não podem ficar para sempre.
Seria algo como babá até provecta idade (o que até ocorre, mas não é a regra).
A mais costumeira resposta ele ouvia à sua pergunta simples "por que trabalha?" era o chavão, penso bem obtuso : "por que sou obrigado".
Hoje pela manhã andando pela fábrica, observei com imaginados olhos de patrão a reação à denominam "obrigação ao trabalho".
Homens adultos se escondendo em banheiros, por longos períodos. Outros, cientes dos horários chefes passam, nos intervalos, como se fossem detentos, encostam em suas bancadas de trabalho e nada fazem.
Silencioso protesto contra a "obrigação" ao trabalho.
Nosso país de fato não tem saudável tradição trabalhadora. A razão imagino inicia com a escravidão, onde o trabalho era conseguido com violência. E segue com o podre serviço público, com o cargo conquistado em concurso ou com pistolão, onde nada se faz. Algo como juízes com seus 60 dias de férias e "auxílio moradia" retroativo, com somas pornográficas, autorizado por outros juízes.
Talvez doutrina generalizada, o trabalho é para otários. E quando possível, mesmo "obrigado" a ele, malandramente mostrar "cara, de mim nada espere, trabalho pelo dinheiro, não para alimentar patrão."
As consequências são terrível rotatividade e já apostando na vitória certa diante do cipoal legislativo a proteger o trabalhador, um passeio à justiça, reclamando contra o empregador.
Nisso somos campeões mundiais, com 2.900.000 processos trabalhistas em curso. Nossos vizinhos argentinos tem 15.000, nos EUA correm 100.000...
Meu pai às vezes indignado com certa morosidade em vista da reação ao trabalho, discretamente pela condição de estrangeiro, em baixinho alemão dizia a mim: "nesse país não se inventou o trabalho, mas seguramente o discurso contra ele...".
É fato, a maioria o faz com declarado desprazer, mesmo alguns ainda nem trabalham, como estudantes. É desprezado, comparado a trabalhos forçados de escravos.
Jamais a remuneração é a correta, mesmo sendo um deputado federal a ir 2 dias por semana à camara. Sonha-se com a aposentadoria precoce, o nada fazer, cuidar de netos e o restante discurso todos conhecemos.
O prazer no trabalho bem feito, nesses anos todos, não me pareceu algo desejado no país.
Por isso não temos marcas prestigiosas, não temos produtos manufaturados de alguma sofisticação desejados mundo afora, não temos escritores de relevância com uma única exceção (o que confirma a regra) ou grande atores de projeção global. Nenhum prêmio Nobel, nenhum Pulitzer, nenhum Oscar, nenhum grande explorador, nenhum grande pacifista ou educador.
Mas somos campeões por várias vezes naquilo se preza com seriedade quase monástica, uma brincadeira, um lazer: o futebol.
Não sei se isso é bom ou mal. Quando alguém se dedica a algo com certa intensidade e produz resultados, nossa primeira reação é taxá-lo de babaca. Após, se o sucesso persistir, dizemos ser ladrão ou empresário maldoso.
Agora se apadrinhado via corrupção a cargo onde nada necessita fazer, aplaudimos. É esperto, não trabalha, gostamos disso.
Somos assim.